segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Por que as hienas riem?

Kay E. Holekamp é uma zoologista da Universidade Estadual de Michigan, escreve da Reserva Nacional Mara Masai, no Quênia, onde estuda o comportamento de hienas pintadas

Kay E. Holekamp
As três hienas que descobriram primeiro o búfalo em processo de morte se aproximam cautelosamente, observando seus perigosos companheiros de rebannho.
 Quinta-feira, 7 de julho
Acabávamos de começar nossa observação do final da tarde uns poucos dias atrás quando encontramos três hienas adultas, todas fêmeas de alta posição social, dormindo numa vertente aberta. Então vimos algo que nunca noticiamos: um grande búfalo africano macho que aparentemente estava morrendo. Podíamos ver por seus dentes gastos que já era bem idoso, e embora pudesse mover suas pernas, aparentemente não podia levantar a cabeça. Uma coisa no estudo de grandes carnívoros é que a alimentação pode ser difícil de observar. Embora as hienas possam matar rapidamente pequenas presas como uma gazela, quebrando seu pescoço ou seu crânio, elas tendem a matar grandes animais por evisceração, causando hemorragia, o que pode levar bastante tempo. Sempre esperamos que as presas estejam em estado de choque quando isso acontece, já que não podemos fazer nada para acelerar a morte do animal. Como o poeta Tennyson destacou, a natureza é “vermelha do dente à garra.”
Eventualmente as três fêmeas saíram de sua soneca e perceberam o búfalo. Elas se aproximaram silenciosamente, evitando as pernas desengonçadas do animal à medida que começaram a arrancar pedaços da carne com dentes afiados. Quando o animal prestes a morrer começou a urrar de dor, outros búfalos avançaram sobre as hienas, as quais fugiram, mas se aproximaram novamente para continuar a alimentação. Ainda assim as hienas continuaram quietas, sugerindo que ou não precisavam de ajuda para abater a presa ou não queriam dividi-lo com seus companheiros de grupo. Porém, como acontecem muitas vezes, outras hienas aparentemente ouviram o choro do búfalo que morria e começaram a surgir de todas as direções.






Um jovem que chega ao abatedouro (agachado na grama) é investigado pelas hienas que já se encontrava ali. Outros jovens apressam-se para chegar ao local, ao fundo.
Os membros recém chegados do grupo estavam muito excitados em ver por volta de 750 quilos de carne fresca já caída no chão! Mas não foi tão excitante quanto a chegada dos mais novatos, recentemente graduados da toca comunal, ao local do abatedouro, começamos a ouvir vozes de hienas. À medida que cada jovem chegava ao local, estava evidente sua grande excitação e nervosismo. Isso pode ser claramente notado por suas posturas corporais, a cauda eriçada e, principalmente, pelas vozes emitidas. Eles riam e se abaixavam antes das grandes hienas do grupo o fazerem, produzindo muitas vocalizações parecidas a urros.
Uma comunicação eficiente entre indivíduos é crucial para uma troca fiel de informação em qualquer sociedade tão complexa quanto àquela das hienas com pintas. Como em muitos outros animais, a comunicação entre hienas pintadas serve de diferentes funções, incluindo identificação do indivíduo, recrutamento de aliados, reforço de laços sociais entre membros do grupo, indicação de posição social, coordenação de atividade do grupo e modulação da agressão entre membros do grupo. Hienas pintadas dependem grandemente da informação contida em sinais visuais e táteis quando estão próximos de membros do grupo, e da informação contida nos sinais olfatórios e acústicos quando estão a curta e longa distância. Por exemplo, as caudas levantadas e eriçadas vistas nas hienas que atacaram esse búfalo sinaliza uma tensão e excitação considerável. Escrevi em meu blog o trabalho que estamos fazendo sobre a comunicação olfatória nessa espécie. Porém, esses animais talvez sejam mais bem conhecidos por suas vocalizações.
Hienas de pintas possuem um repertório vocal rico; elas emitem por volta de uma dúzia de vocalizações distintas, muitas das quais podem ser moduladas de várias maneiras para alterar seu significado aos ouvintes. Hienas pintadas são muitas vezes denominadas de “hienas que riem” devido às suas vocalizações em forma de risada que se parecem muito com risadas humanas histéricas. A risada é alta, de alta freqüência (som agudo), em séries rápidas de “hee-hee-hee” e súbitas. Hienas marrons e listradas não produzem risadas ou urros, ou qualquer tipo de vocalização de fato, logo, a risada aparenta ser verdadeiramente algo de hienas pintadas. Hienas muitas vezes riem após serem atacadas e enquanto são perseguidas por outra hiena que quer parte da carcaça, quem dá a risada é aquela que tem a carcaça na boca. A hiena que ri aparenta sinalizar ao seu companheiro social que desista e a deixe em paz. Infelizmente, a risada de uma hiena que carrega um alimento tende a atrair outras hienas para ela, resultando muitas vezes em mais perturbação direcionada a quem fez o chamado.
A hiena que carrega a cabeça e medula estava dando muitas risadas à medida que seu companheiro de grupo a perseguia.
Quando hienas querem coordenar parceiros de grupos para formar coalizões contra os leões, elas produzem uma vocalização denominada “mugido”, o que se parece muito ao mugido de vaca. Hienas de pintas produzem “ruídos de alarme” para sinalizar perigo; essas vocalizações são graves, rápidas e súbitas, podendo ser ouvidas mais freqüentemente quando um leão ou um humano a pé surge na linha de visão de um grupo de hienas. Quando a mãe hiena quer chamar seus filhotes para fora da toca, elas gemem dentro da toca e suas crias aparecem na superfície. Quando os filhotes estão com fome, eles produzem um som parecido ao arranhar de unhas da lousa com seus lábios puxados acima dos dentes para obrigar a mãe a se deitar para que possam se alimentar. Chamamos esse som desagradável de “squitter”.
Um jovem que quer mamar vocaliza (“squitt”) à sua mãe, a qual acabou de chagar à toca.
A vocalização em urro em hienas é uma série de chamados discretos produzida num pulso de sons que pode atravessar distâncias de mais de 3 quilômetros. As vozes dos adultos são graves, mas os urros emitidos pelos mais jovens durante a morte do búfalo tinham um som agudo. A taxa nas quais os urros são produzidos dentro de um pulso comunica a intensidade emocional aos ouvintes. Deitada em minha barraca a cada noite, eu pude ouvir os urros calmos e lentos produzidos por hienas machos imigrantes anunciando sua presença ao grupo. Dentro dos meus favoritos estão os urros produzidos por um macho chamado “Pavarotti”, então denominado devido às suas chamadas de longa distância ser excepcionalmente musicais.
Muitas hienas se amontoam sobre o búfalo em processo de morte.
Porém, os urros dos mais jovens durante a morte do búfalo vêm em rajadas, dificilmente com intervalos de meio segundo entre eles, logo os jovens estavam extremamente excitados. Embora os urros possam ter várias funções diferentes na sociedade das hienas, os urros dos jovens atraíram as fêmeas para o local; suas mães chegaram pouco tempo depois juntamente com outros parceiros de grupo que estavam de escuta. Logo havia por volta de 35 hienas se alimentando do búfalo, o qual finalmente sucumbiu e seus companheiros de rebanho não mais tentaram defendê-lo. Poucas horas depois tudo o que sobrou desse enorme animal foi seu crânio, alguns outros ossos nus e manchas ensangüentadas no chão onde o búfalo se deitou pela última vez.
Fonte: The New York Times (http://bit.ly/oyjxg9)
Tradução
Sociedade Racionalista da USP/RP
racionalistasusp.wordpress.com


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